A carroça do caos

Estou cansado de puxar a carroça do caos.
Estou esmigalhado sob a mó do tempo, que não pára, não pára.
Convivo com cadáveres, fantasmas e fantoches do destino.
Os homens acreditam em destino e são meros fantoches.
Os homens não acreditam em Deus e contam piadas
com medo da própria sombra, eles que já nem sombra não têm.
Sou escravo dos meus cinco sentidos e gemo e suo sangue
porque Deus não me ouve. Como se Deus tivesse que me ouvir.
O homem é patético diante do silêncio de Deus.
O homem é cego e surdo e castrado e quer ouvir a voz de Deus.
Eu fui castrado do meu sentido essencial: o êxtase.
Eu fui castrado da contemplação do divino e agonizo.
O demônio me puxa por uma perna e leva a minha alma.
Eu navego no mar de veneno da minha vida.
Eu estrangulo os lírios do campo.
Eu estrangulo os pássaros do céu.
Estou nu como uma pedra, como um sabugo apodrecendo no campo.
Acalento a desgraça no peito como uma serpente ou um abutre.
A serpente me leva o coração como uma maçã sangrando.
O abutre me devora o fígado, os olhos, a língua.
Eu nego a graça do Pai, com um martelo quebro o relógio do Pai.
Depois reclamo que não tenho mais tempo, ó enclausurado.
Fui condenado desde o princípio dos tempos.
Amei com um ódio vil a minha condição de réprobo.
Sou um profeta maldito com a tempestade de Deus na ponta dos dedos.
A vida me foge, sapateio no palco, a multidão aplaude.
Espero a impossível salvação.
A montanha vai desabar.
Um sinal de Deus e eu ateio fogo em mim e no mundo.

Poema de José Carlos Brandão
Escrito em 23-11-07



Tributo ao presente e homenagem ao poeta...

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